Financiamento das indústrias criativas de África
Marie Lora-Mungai é empresária, autora, oradora e investidora. É também, e acima de tudo, uma consultora líder que trabalha para estruturar o florescente sector das indústrias culturais e criativas de África. A sua experiência única, desde os corredores da CNN em Nova Iorque até às movimentadas metrópoles de Lagos e Nairobi, dá-lhe uma compreensão íntima dos desafios e oportunidades do continente. Descubra como Marie Lora-Mungai está a trabalhar para transformar o potencial criativo de África numa indústria que gera emprego e crescimento.
Uma carreira singular ao serviço da criatividade africana
O percurso de Marie Lora-Mungai até à especialização nas ICC africanas é fruto de uma trajetória arrojada e autodidata. Depois de estudar em França, começou a sua carreira como jornalista na CNN em Nova Iorque. Mas o apelo do campo foi mais forte. Em 2006, deixou tudo para trás para se instalar no Quénia, sem emprego e sem contactos, uma decisão que marcou o início da sua imersão africana.
Aí, tornou-se correspondente da AFP, da Reuters e da BBC, cobrindo uma dúzia de países. Foi durante este período que observou a ebulição criativa e a inovação tecnológica do continente, muito antes da narrativa “Africa Rising”. Esta curiosidade levou-a ao empreendedorismo. O seu primeiro empreendimento foi a co-fundação de uma empresa de produção no Quénia em 2009, o que lhe permitiu lançar a versão local de “Les Guignols de l’info”, o “XYZ show”. O programa foi um sucesso retumbante, com mais de 10 milhões de espectadores e 14 temporadas. Ao mesmo tempo, Marie desenvolveu uma plataforma móvel de vídeo a pedido, pioneira em África, que foi adquirida pelo grupo Trace em 2016, bem como uma agência de gestão de talentos.
Esta experiência prática em 27 países africanos deu-lhe um conhecimento único. Atualmente, Marie põe estes conhecimentos ao serviço de grandes grupos (Warner Brothers, Netflix, Twitter) que pretendem expandir-se em África e de investidores (AFD, Banco Mundial, fundos privados) que pretendem financiar as ICC. O seu papel consiste em fornecer análises de mercado, desenvolver estratégias de investimento e conceber ferramentas financeiras.
A explosão das ICC e o desafio do investimento
Marie Lora-Mungai foi testemunha da transformação radical das ICC africanas nos últimos 15 anos. O advento da Internet, das redes sociais e das plataformas de streaming derrubou barreiras, permitindo que a criatividade africana chegasse a um público global. A explosão de géneros como o Afrobeat e Nollywood é a prova mais óbvia deste facto, mas esta dinâmica teve repercussões em todos os sectores.
Esta efervescência tem atraído fluxos financeiros. “Foram libertados cerca de 3 mil milhões de fundos para as indústrias criativas em África, provenientes de grandes doadores”, revela Marie. O dinheiro já não é o problema. O verdadeiro desafio reside agora na capacidade de os empresários estarem “preparados para receber este dinheiro”. Muitas empresas criativas ainda são informais ou carecem de gestão empresarial e de competências financeiras, o que as torna pouco atractivas para os investidores que procuram um retorno do seu investimento. O novo cavalo de batalha de Marie é “elevar o nível de competências dos empresários” para que possam cumprir as normas do investimento privado.
O soft power africano, uma alavanca para o desenvolvimento
As indústrias culturais e criativas são uma poderosa alavanca de “poder suave” para África, moldando a imagem do continente à escala global. Marie congratula-se por constatar que muitos governos africanos compreenderam a importância estratégica desta questão. A Nigéria, por exemplo, criou um novo Ministério da Economia Criativa, das Artes, da Cultura e do Turismo. Países como o Benim, o Senegal, a Costa do Marfim, o Ruanda e Marrocos estão a intensificar os seus esforços, lançando grandes projectos para apoiar as suas ICC.
Este compromisso político valida o papel das ICC como grandes criadoras de emprego para jovens e mulheres, contribuindo diretamente para o crescimento económico. Ao dar uma luz positiva através da sua cultura e dos seus artistas, estes países atraem outros investimentos e projectos, criando um círculo virtuoso de desenvolvimento.
O futuro das ICC africanas
Nos próximos cinco anos, Marie Lora-Mungai identifica uma série de questões e oportunidades urgentes para as ICC africanas:
- Estruturação e alianças: É imperativo que os empresários compreendam como se devem estruturar e “falar com os investidores”. Marie está a insistir na ideia de criar alianças, joint ventures ou fusões para formar “empresas maiores” e, assim, atrair investimentos mais substanciais.
- O impacto da inteligência artificial (IA): a IA está a perturbar os ecossistemas, nomeadamente os processos de produção e os tipos de emprego. Embora, historicamente, África tenha tido uma vantagem em termos de custos de produção, a IA está a nivelar as condições de concorrência. A concorrência basear-se-á agora nas ideias e na capacidade de adaptar estas ferramentas tecnológicas. Marie adverte que África precisa urgentemente de compreender estas questões se não quiser ficar para trás.
- A chegada de jogadores internacionais: Grandes nomes do desporto (NBA, NFL) e do entretenimento (Livenation) continuam a chegar a África, validando o interesse global no mercado. Trata-se de uma grande oportunidade, mas que exige que os actores locais saibam aproveitar.
Uma mensagem para os jovens empresários africanos
Marie Lora Mungaï tem uma mensagem clara para os jovens empresários africanos que pretendem utilizar a tecnologia para inovar no domínio das ICC: “Comecem pelo problema, não pelo burburinho. O continente está cheio de desafios reais que são também oportunidades. Não devemos esperar condições perfeitas ou financiamentos substanciais, mas sim “utilizar o que temos, ficar perto dos nossos utilizadores e construir algo que realmente os ajude”.
A Comissária encoraja-nos a não ter medo de nos aventurarmos em sectores que são “muitas vezes incompreendidos ou subestimados”. Moda, música, cinema, arte – estas indústrias moldam a perceção de África no mundo. A tecnologia pode estruturá-los e torná-los mais sustentáveis. Por último, a perseverança é fundamental: “A inovação não tem apenas a ver com velocidade. Trata-se de manter o empenhamento, mesmo quando é difícil.” Com o tempo, o trabalho com significado falará mais alto. “Continuem a trabalhar. África precisa das suas ideias.”
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